Kassandra Menezes (assistente social do INSS e presidente do Cress/PB); Ariadna Queltre (assistente social do INSS); e Raquel Alvarenga (assistente social e representante técnica do Serviço Social no INSS).

A Previdência social brasileira, que completou 95 anos nesta quarta-feira (24), direito fundamental do/da trabalhador/a, tem como marco de sua história como a conhecemos hoje, a Lei Eloy Chaves.

A Lei Eloy Chaves (publicada no dia 24 de janeiro 1923) consolidou a base do sistema previdenciário brasileiro, com a criação da Caixa de Aposentadorias e Pensões para os empregados das empresas ferroviárias. Após a promulgação dessa lei, outras empresas foram beneficiadas e seus empregados também passaram a ser segurados da Previdência Social. Ao longo dos anos, surgiram vários institutos que visavam garantir o direito da aposentadoria e benefícios da previdência, e, assim, foram criados o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), em junho de 1933; dos Comerciários (IAPC), em maio de 1934; dos Bancários (IAPB), julho de 1934; dos Industriários (IAPI), dezembro de 1936; e os de outras categorias profissionais. Em 1966, todos institutos que atendiam aos trabalhadores do setor privado foram unificados com a criação do Instituto Nacional de Previdência Social – INPS.

Apesar da criação da Previdência Social remontar aos anos 1930, somente com a Constituição Federal de 1988 essa política pública, juntamente às de Saúde e Assistência Social, passa a integrar a Seguridade Social brasileira. Os avanços na política previdenciária, inscritos na Constituição de 1988, e os direitos duramente conquistados, encontram-se fortemente ameaçados. As propostas de contrarreforma do sistema previdenciários, iniciadas na década de 90 e ampliadas pelo atual governo ilegítimo, foram consolidadas atualmente na Proposta de Emenda Constitucional (PEC 287/16), que visa alterar as regras de acesso aos benefícios previdenciários, destroem conquistas de décadas do trabalhador/a brasileiro/a. Vivenciamos uma conjuntura de retrocessos no que tange aos direitos sociais.

Para falar sobre um tema tão importante para a sociedade e para o Serviço Social, conversamos com Raquel Alvarenga, assistente social e Representante Técnica do Serviço Social no INSS; Kassandra Menezes, assistente social do INSS e Presidente do Cress/PB; e Ariadna Queltre, assistente social do INSS e conselheira do Cress/PB.

Contrarreforma da Previdência Social

As conquistas na política previdenciária, inscritas na Constituição Cidadã, não perduraram por muito tempo. Já na década de 1990, a Previdência sofreu mudanças sensíveis e profundas.

O CFESS Manifesta “Não à contrarreforma da Previdência” de março de 2017 destaca momentos importantes em que a previdência sofreu mudanças:

– 1998: pela Emenda Constitucional nº20, que restringiu direitos, sobretudo, relativos ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), pela extinção e reconfiguração de benefícios, redução de seus valores e do tempo de usufruto.

– 2003: novos ataques sob as mesmas diretrizes atingiram os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS);

– 2012: foi autorizada a criação da Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp), para gerir planos de previdência complementar para os servidores dos três poderes da União;

– 2014: as Medidas Provisórias 664 e 665, convertidas, respectivamente, nas Leis nº 13.135 e 13.134, em junho de 2015, modificaram um leque de benefícios, minimizando os seus valores, reduzindo os tempos de usufruto e limitando o acesso dos trabalhadores e trabalhadoras;

– 2016: a extinção do Ministério da Previdência Social e Trabalho; foi encaminhada à Câmara dos Deputados a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 287/2016), cujo conteúdo denuncia seus acordos com o capital financeiro.

“Desde a Lei Eloy Chaves até o fim dos anos 90, tivemos a perspectiva de ampliação de direitos. A Reforma conseguiu atingir desde o trabalhador rural até a classe média e a elite. Hoje vivenciamos uma contrarreforma que reduz direitos duramente conquistados. O alvo atual do mercado capitalista é a Previdência. O Serviço Social não está imune a essa verdadeira contrarreforma, seja no ponto de vista de ser trabalhador/a, dos espaços sócio ocupacionais ou do usuário que é atendido cotidianamente. ” – Raquel Alvarenga

Como ressalta Kassandra Menezes, “cada vez mais, vemos a previdência reduzida, restritiva e voltada para os interesses do capital. O caráter público e solidário da previdência cada vez mais se distancia, caminhando a passos largos para financeirização da cobertura previdenciária e abrindo espaço para privatização. A lógica perversa da PEC 287/2016, além de restringir direitos, coloca trabalhador contra trabalhador. O que deveria unificar a classe trabalhadora, segrega e divide, fazendo com que cada um defenda os seus próprios interesses. O resultado é um enfraquecimento das lutas”.

Conheça algumas das principais mudanças se a contrarreforma da Previdência Social for aprovada pelo Congresso e quais serão os impactos na classe trabalhadora, apresentadas também pelo CFESS (CFESS Manifesta “Não à contrarreforma da Previdência”), além de outros manifestos e notas contra o desmonte da Seguridade Social. Aproveitamos para destacarmos, aqui, alguns pontos. :

Na prática, a PEC anuncia o fim das aposentadorias sob os sistemas públicos, a desproteção dos mais pobres e uma potente expansão da previdência privada, por que:

• Mudança da idade mínima de 65 anos, para homens e 62 para mulheres, aumento do tempo mínimo de 15 para 25 anos de contribuição.  Para os trabalhadores rurais, terão que ter 60 e 57 anos (homens e mulheres). 

• Muda a contribuição do trabalhador e trabalhadora rural (segurado especial) de 2,1% sobre a comercialização de seus produtos, para o grupo familiar, para uma alíquota individual sobre o salário mínimo;

•A reforma pretende acabar com a aposentadoria por tempo de contribuição.

• Impede a acumulação de duas aposentadorias – exceto nos casos previstos pela Constituição Federal – uma aposentadoria e uma pensão por morte do cônjuge ou duas pensões por morte de cônjuges; Quanto ao acúmulo de pensão com aposentadoria, poderá ocorrer até o limite de dois salários mínimos;

• Reduz os valores das pensões para 50%, com 10% para cada dependente até 100% e as partes dos dependentes prescritas não reverterão ao/à cônjuge;

• Eleva a idade para acesso ao Benefício da Prestação Continuada (BPC) por pessoas idosas de 65 para 68 anos, com a ameaça da desvinculando também do seu valor ao salário mínimo;

• Extingue as aposentadorias especiais dos trabalhadores e trabalhadoras de áreas de risco e de professores e professoras da educação básica e muda as regras de aposentadoria de pessoas com deficiência.

• Proíbe a criação de novos RPPS pelos estados e municípios e obriga aos que mantiverem o RPPS fixar o teto do RGPS para a aposentadoria e a criar a previdência complementar;

 

Fonte: CFESS Manifesta “Não à contrarreforma da Previdência

 

“A posição do conjunto CFESS-CRESS é de que somos totalmente contra os retrocessos de direitos, sejam eles trabalhista, previdenciários, na política da saúde mental, nos cursos à distância, no corte do orçamento das políticas sociais etc. Nós nunca ficamos em cima do muro, sempre tivemos um posicionamento muito firme.” – Raquel Alvarenga

O Serviço Social na Previdência Social: trajetória de luta e resistência

Na conjuntura das contrarreformas do Estado e da Previdência Social, vivenciamos também a redução no quadro de servidores e desestruturação de serviços previdenciários, como o Serviço Social e a Reabilitação Profissional, na perspectiva da terceirização e privatização.

“O Serviço Social na Previdência se confunde com a própria história da profissão, que completa 82 anos, pois fomos inseridos nessa política no Governo de Vargas. As/os assistentes sociais, mesmo na sua concepção conservadora, foram de vanguarda, por sempre lutarem por uma uniformização e construírem planos de ação, respeitando as especificidades das classes trabalhadoras. Nos anos 90, com a redemocratização do Estado brasileiro, o Serviço Social da Previdência foi atingido, mas ainda conseguiu aprovar a Matriz Teórico-Metodológica do Serviço Social, com a concepção de direitos sociais, seguridade, democracia, cidadania, e tudo isso incorporado ao nosso fazer profissional. Os encontros nacionais e regionais da profissão se tornaram encontros políticos e tomamos fôlego para lutar contra os retrocessos. O fim dos anos 1990 foi difícil para a profissão e para demais categorias, mas, com a ajuda do Conselho Federal de Serviço Social, dos Conselhos Regionais e Movimentos Sociais, conseguimos permanecer na instituição, conquistando o concurso público do INSS em 2009, por exemplo. A uniformidade, construída coletivamente com a Matriz e o Manual Técnico do Serviço Social, ajuda a resistir e a fortalecer a categoria – Raquel Alvarenga

“Historicamente, o INSS é um espaço sócio-ocupacional de muita resistência, marcado pela luta e organização política dos/das assistentes sociais em seu interior. Mesmo inicialmente tendo um viés conservador, foram construídos caminhos que nos respaldaram na instituição. É um espaço de muita intervenção junto aos movimentos sociais, pois temos um trabalho muito forte com os usuários e a sociedade civil como um todo.” – Kassandra Menezes

Ao Serviço Social do INSS, compete esclarecer junto aos beneficiários seus direitos sociais e os meios de exercê-los e estabelecer conjuntamente com eles o processo de solução dos problemas que emergirem da sua relação com a Previdência Social, tanto no âmbito interno da instituição como na dinâmica da sociedade” (art. 88, da Lei de Benefícios da Previdência Social).

 

“A atuação da/o assistente social se dá no âmbito interno, dentro das agências da previdência social e também no âmbito externo em articulação com as instituições e os movimentos sociais da sociedade como um todo. Hoje, um das principais demandas para o profissional de Serviço Social dentro do INSS, são as avaliações sociais do Benefício de Prestação Continuada (BPC), socialização de informações sobre benefícios previdenciários e assistenciais e emissão de pareceres sociais. Dentro dessas ações, tanto no âmbito interno, quanto no âmbito externo tomamos como parâmetro um dos princípios do nosso código de ética, que é a universalização e ampliação das políticas e dos direitos.” – Raquel Alvarenga

O Serviço Social visa garantir a informação sob a ótica do acesso aos direitos e ampliação do exercício da cidadania, trabalhando em três linhas de ação: direitos das pessoas com deficiência e idosas, consolidação e ampliação do acesso à previdência e saúde do trabalhador. O nosso direcionamento ético-político e profissional, pela ampliação da democracia e dos direitos sociais, tem sido vivenciado em um ambiente de fortes tensionamentos, diante dessa conjuntura política e econômica, em especial de contrarreforma da previdência.” Ariadna Queltre

“O nosso posicionamento é muito definido. Dentro dessas contradições e limites institucionais, não deixamos de defender nossas bandeiras de lutas e de nos posicionar.” – Kassandra Menezes

O conjunto CFESS-CRESS sempre se posicionou duramente contra a Reforma da Previdência, defendendo os direitos da classe trabalhadora como um todo e a não privatização da previdência. O constante debate, as mobilizações sociais e lutas no cotidiano das/os assistentes sociais fazem parte dessa resistência. O CFESS se posiciona e afirma que o dever das/os profissionais é “estimular o debate crítico sobre a PEC/287 e as suas consequências para a classe trabalhadora e para a reconfiguração da seguridade social. Assim, é preciso acompanhar e potencializar a agenda das lutas sociais em defesa da seguridade social e contra esta expropriação de direitos da classe trabalhadora pelo capital!” (CFESS Manifesta, março 2017).

Resistência do Serviço Social na Previdência

A Previdência Social é uma instituição de grande importância para o Estado e, sobretudo, para a população brasileira. O seu histórico, que vem desde o século XIX, é marcado por reformas, visando a ampliação de acesso da classe trabalhadora e desmontes, sendo alvo constante de mudanças políticas e econômicas e de interesse do capital. O Serviço Social, como parte integrante da Previdência, sempre esteve lutando contra retrocessos e se mantendo firme no posicionamento do exercício profissional dentro da instituição, visando a garantia de direitos dos/as trabalhadores/as brasileiros/as. Encontros nacionais e regionais, sindicatos, participação conselhos profissionais e movimentos sociais marcaram a resistência da profissão de assistente social, que teve um papel fundamental na história da previdência brasileira.

Desafios da/o Assistente Social na Previdência Social

O cotidiano profissional de qualquer trabalhador é desafiador, especialmente diante da atual conjuntura política-econômica em que se encontra o país, com retrocessos no que tange aos direitos da classe trabalhadora. A direção atual do País, impacta diretamente na vida da classe trabalhadora e diretamente nos espaços de atuação do/a Assistente Social, com a intensidade na focalização-seletividade e precarização dos serviços e políticas sociais. O dia a dia da/o assistente social que atua na previdência social, não é diferente.  É marcado por ameaças constantes e a iminência da aprovação da PEC 287/2016.

“Trabalhamos na perspectiva da ampliação e consolidação dos direitos previdenciários, dentro de uma instituição que vem incorporando cada vez mais a lógica do mercado, e, por isso, estamos sempre vivenciando ameaças – como de extinção, desvio de função, polivalência, generalização da profissão do assistente social etc. Isso exige de nós um enfrentamento coletivo, e aí está a importância de se fazer presente nos espaços que nos representam, participando e construindo juntos/as, tanto para intervir, quanto para fortalecer e defender o que a gente acredita“. – Kassandra Menezes

 

“Vivemos em uma instituição que cada dia mais se veste como uma instituição privada. Precisamos conhecer o que está na reforma e nos vários espaços sócio-ocupacionais e fazer uma leitura crítica. Precisamos levar essa socialização para o usuário e participar vivamente das mobilizações, dos fóruns, e todos os espaços de debate. Isso é um dever nosso, enquanto assistentes sociais. As palavras de ordem são: participar, lutar e resistir.” – Raquel Alvarenga

Finalizamos ratificando o posicionamento do CRESS/PB, contrário à perspectiva da focalização e de restrição de acesso aos direitos sociais constituídos, defendendo a universalização da Seguridade Social como “pública, possível e urgente”. Assim, “convocamos a categoria a se manterem firmes e seguir na luta contra toda e qualquer expropriação de direitos da classe trabalhadora” (Kassandra Menezes).

Kassandra Menezes (assistente social do INSS e presidente do Cress/PB); Ariadna Queltre (assistente social do INSS); e Raquel Alvarenga (assistente social e representante técnica do Serviço Social no INSS).

 

Mariana Costa – JP/PB 3569

Assessoria de Comunicação 

Conselho Regional de Serviço Social da Paraíba – CRESS/PB

Gestão “Avançar sem temer” – 2017/2020

E-mail: assessoriacresspb@gmail.com